quarta-feira, 22 de julho de 2009

A relevante contribuição limitada das ferramentas tecnológicas à luta revolucionária

A discussão sobre a imensa amplitude das novas tecnologias tem se tornado recorrente nos dias atuais.

O acesso à Internet tornou-se algo ao alcance de 1 bilhão de pessoas no mundo inteiro. [1]

Os celulares também se espalham não apenas pelas metrópoles, mas por quase todos os rincões do planeta.

A popularização do acesso a estas e outras ferramentas tecnológicas possui um caráter altamente contraditório: ao mesmo tempo que bilhões de pessoas podem se comunicar com outras através de computadores e celulares, a maior parte da população mundial (nos países pobres, principalmente) continua vivenciando uma exclusão digital e, sob a lógica do capital, as tecnologias são monopolizadas por grandes empresas do ramos da informática e da telefonia.

Os donos das indústrias da informática e da telefonia sofrem resistência dos movimentos e ativistas pela democratização da comunicação, como a luta pelo software livre.

A maioria dos usuários da Internet e de celular é composta em grande parte por jovens, que dedicam boa parte de seus dias ao uso de tecnologias.

De uns cinco anos para cá, as chamadas "redes sociais" (Orkut, Facebook, MySpace) viraram um fenômeno. Mais recentemente, o Twitter tornou-se a menina dos olhos das redes sociais. A rede P2P troca músicas, programas, filmes e sofre dura oposição das indústrias fonográfica e cinematográfica e da direita em sua cruzada antipirataria.

Os torpedos SMS e toques musicais viraram mania nos celulares, sendo que todos os novos modelos de celulares possuem WAP e espaço para MP3. Os blogs também se proliferaram aos montes e, assim como as redes sociais, ganharam a simpatia deste recém-blogueiro que vos fala.

O esporte, a música e o sexo estão entre as coisas mais buscadas e discutidas na Internet. Mas também há espaço para outros temas, como a política, a cultura, a educação, entre outros.

O movimento contra a repressão protagonizado por estudantes, trabalhadores, mulheres e minorias religiosas e nacionais no Irã utilizou o Twitter como ferramenta de comunicação e divulgação dos acontecimentos e mobilizações. Estranhamente, alguns chegaram a cogitar a existência de uma "revolução via Twitter" no Irã. [2]

Em menor escala, a Internet foi amplamente utilizada na divulgação de lutas contra os efeitos da crise do capitalismo na Europa e nos Estados Unidos e na resistência ao golpe militar em Honduras.

No Brasil, a luta de estudantes, professores e funcionários contra a repressão e por democracia na USP ganhou grande notoriedade em junho. Relatos, fotos e vídeos pipocaram pela web, atos contra e em defesa do movimento eram divulgados nas redes sociais e listas de e-mails. [3]

Apesar da permanência da fragmentação e do isolamento entre as lutas sociais – e do refluxo do movimento de massas no caso brasileiro – vemos que não faltaram demonstrações de luta e resistência pelo mundo afora durante o primeiro semestre de 2009, que começou marcado pelas grandes mobilizações contra o massacre israelense aos palestinos na Faixa de Gaza.

Blogs e sites de esquerda estão na praça cibernética, mas em quantidade e alcance ainda incomparáveis à força do senso comum reforçado cotidianamente nos sites da mídia burguesa.

Os recursos audiovisuais que podem difundir nossas idéias de maneira inimaginável, por exemplo, ainda não são devidamente aproveitados: podcasts, vídeos, animações, entre outras possibilidades proporcionadas pelo mundo virtual.

No entanto, existem duas posturas equivocadas que persistem sendo hegemônicas entre a esquerda em relação ao tema: os "militantes jurássicos", que desprezam de forma retrógrada a relevância da utilização do mundo virtual para a luta revolucionária, e os "militantes virtuais", que supervalorizam a importância do mundo virtual, chegando ao ponto às vezes de sobrepor ilusoriamente às ações neste ao mundo real.

Faz-se extremamente necessário superar essa falsa dicotomia, não podemos negar ou superestimar a importância das ferramentas tecnológicas. Imaginemos então as dificuldades enfrentadas pelos revolucionários russos na questão da comunicação durante o início do século XX:

O blogueiro socialista inglês, Adrian Cousins, do Socialist Workers Party britânico resume bem a situação:

Os bolcheviques construíram um partido de massas e tomaram o Estado sem a ajuda de qualquer tecnologia que não fosse a imprensa (algo novo e revolucionário naquela época).Eles não utilizaram telefones para conversar entre si porque o telefone não era uma tecnologia amplamente disponível a milhões de pessoas. Não era disponível aos bolcheviques e nem às outras forças políticas e à classe dominante.

Mas se os telefones estivessem amplamentre disponíveis entre os trabalhadores de Petrogrado, os bolcheviques não seriam capazes de tomar o poder sem a utilização de telefones. Todas as outras forças políticas usariam telefones, incluindo os mencheviques, a burguesia e os monarquistas. Não utilizando tecnologias disponíveis para se comunicar da forma mais ampla e massiva possível, os bolcheviques abandonariam o espaço para outros que utilizariam a nova tecnologia como uma arma contra os bolcheviques.
[4]

Há que se tomar o cuidado de não se deixar levar por um "conspiracionismo", mas é verdade que não podemos esquecer da segurança e confiar ingenuamente na idéia de que não há vigilância das ações dos movimentos sociais pela Internet.

Também é óbvio que a transformação revolucionária da sociedade não se dará por SMS, e-mail, scrap ou petition online, nada substitui a atividade revolucionária no cotidiano do mundo real. Não podemos cometer o erro de superestimar e nos deixar consumir pelo mundo cibernético em detrimento do contato presencial na luta e na vida e acabar caindo em uma espécie de "militância virtual".

Mas desprezar a relevância dos computadores e celulares no capitalismo contemporâneo em tempos de Orkut, SMS, YouTube e Twitter é cegueira. Se o mundo cibernético fosse inútil e irrelevante, não estaríamos aqui agora entre cliques em teclados e mouses lendo e escrevendo coisas.

Os socialistas têm que defender a luta pelo pleno e irrestrito acesso às tecnologias e à comunicação como um todo, sem entraves propostos por reacionários como Eduardo Azeredo e Hélio Costa, e saber aproveitar e utilizar as ferramentas tecnológicas existentes como armas a seu favor.

Não apenas para fazer a disputa de idéias e dialogar com jovens, trabalhadores e outros setores populares da sociedade, mas também como um importante suporte para organizar a luta pela libertação humana.

O escritor e músico Gil Scott-Heron cantava que "a revolução não será televisionada", mas isso não podemos assegurar. [5] Temos a certeza de que ela não virá por zappings televisivos ou pela banda larga. Um e-mail, um SMS e um vídeo no YouTube são detalhes perto da importância da articulação promovida em reuniões e mobilizações, mas detalhes que podem fazer a diferença para nos juntarmos nas lutas e ruas do mundo real pela construção de uma sociedade livre e radicalmente democrática.

Notas:

[1] Internet passa de 1 bilhão de usuários, segundo a comScore, notícia dada pela InfoWester Notícias em janeiro de 2009:
http://www.infowester.com/noticias/internet-passa-de-1-bilhao-de-usuarios-segundo-a-comscore

[2] Vídeo feito por estudantes sobre a dura repressão policial aos grevistas em junho de 2009:
http://www.youtube.com/watch?v=SF71x_cMWy0

[3] America’s Iranian Twitter Revolution, artigo de Max Forte em junho de 2009:
http://openanthropology.wordpress.com/2009/06/17/americas-iranian-twitter-revolution

[4] A militant network of collaborating agents, artigo de Adrian Cousins em janeiro de 2009:
http://leninism2point0.blogspot.com/2009/01/role-of-online-organ-should-not-be.html?widgetType=BlogArchive&widgetId=BlogArchive1&action=toggle&dir=open&toggle=YEARLY-1199145600000&toggleopen=MONTHLY-1246402800000,MONTHLY-1243810800000

[5] The revolution will be not televised, música de Gil Scott-Heron:
http://www.youtube.com/watch?v=p43YYovonS0

3 comentários:

  1. Bom, o texto está claro, mas há questões que me incomodaram.

    O mundo virtual é em si bem real. Real o suficiente para que a mídia burguesa vislumbre a redução do espaço do jornal de papel em favor do jornalismo digital. Uma distinção entre "real" e "virtual" é descabida. O uso de tecnologias de informação como a imprensa operária pelos bolcheviques funcionava através de circulação de militantes, auxiliada pelo telégrafo e correio. Ou seja, se a imprensa era "real", e as formas de circulação das notícias importavam muito para a efetivação das práticas de organização, com as "novas tecnologias" se dá o mesmo. Como tu deixou claro no teu texto, existe uma luta pela gestão da informação da rede mundial de computadores. E isso passa inclusive pela capacidade de gestão da infra-estrutura de computadores e redes, que é em si bem real. O que você chama de virtual, existe realmente.

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  2. De fato, o "virtual" também é "real" e é permeado pelas relações sociais do mesmo.

    Como argumentei, a relevância das novas tecnologias é inegável e, mais do que a luta pela gestão da informação, pode contribuir como um efetivo suporte para a articulação e organização da atividade revolucionária.

    Também não gosto de utilizar a expressão "virtual", pois dá a impressão que me refiro a algo fantasioso que não tem relação com o "real". Mas fiz questão de citá-la por duas vezes em clara referência às ilusões despertadas no "ativismo cibernético" e a supervalorização descabida das redes sociais, um exemplo é a absurda idéia da "revolução Twitter" no Irã.

    A utilização das novas tecnologias faz-se indispensável hoje e para que tenha incidência, enquanto instrumento de prática revolucionária, no cotidiano não pode prescindir do contato presencial.

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  3. Cara, ainda não está claro para todo mundo que acessa as bagaças que o babado revolucionáiro delaé a possibilidadede organizações orgânicas se articularem em tempo real via nuvem.Sme substituir a assembléia,masdando um upgrade na possibilidade de articulação de seus efeitos, como se militares com um telefone às costa,s mas milhares se articulando para ações de impacto a nível macro. Não existe separação entre o Real e o Virtual. O contato presencial é a bagaça e nego es´ta se iludindo na substituiçaõ ainda por fruto de propaganda e um pensamento de mudnaaç via teconolofgia, ao invés devê-la como isntrumento.

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